sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

SOBRE LIBERDADE e cérebros que saem do lugar.



Quem é mais feliz, o libertador ou o libertado?

Audácia minha tentar uma crônica sobre isso, ainda mais por ser a felicidade algo puramente pessoal, íntimo e mutável (sou feliz hoje e amanhã posso acreditar justamente no contrário, estando na mesma situação).

Quem é o mais realizado, então, já que posso usar outra palavra?

Quem abre a porta e diz, "Pode ir", quem bate as cartas na mesa e diz, "A verdade é que estou blefando!"? Quem é o mais pleno, o que ultrapassa a soleira da porta e ganha a liberdade ou o dono da chave? Seriam os colegas na mesa de jogo? Ou o mentiroso?

Eu não sei a resposta. Eu não sei mais muitas coisas porque venho perdendo-as pelo caminho - aquilo tudo que eu carregava -, como se meu cérebro tivesse saído do lugar. 

A minha mãe, ao telefone, disse-me isto: "Com a experiência, parece que não temos mais espaço para certas pessoas e suas idiossincrasias e por isso as deixamos, simplesmente porque nosso cérebro saiu do lugar e passou a funcionar de forma diferente. E essa "saída do lugar" é irreversível.".

Meu cérebro moveu-se. Ele não pensa mais como antes, da mesma forma que o universo desalinhou-se quando aconteceram as duas bombas atômicas. O movimento foi quase imperceptível, mas ocorreu, assim comigo. Não sei precisar data. Às vezes, penso que foi após a morte do meu pai e ele me deixar a herança de que se deve desejar viver até a pele trincar no osso, mesmo não tendo mais apetite, mesmo todo machucado, mesmo nem sabendo mais o seu nome. Viver! Isso eu lia em seus olhos o tempo todo. 

Por causa dessa mudança na posição do meu cérebro, eu poderia inclusive refazer toda a minha documentação e trocar de nome.

Você que me lê, poderia ajudar-me? Quem fica mais completo, quem ganha mais? Ou seriam os dois, cada um do seu jeito? Mas se falo em duas pessoas ou mais nunca terei igualdade de resultado. Cinquenta para um, cinquenta para o outro. Aquela coisa do "ficamos empatados"! Gente é matéria humana, não exata.

Se me apertarem um pouco, eu poderia dizer que quem ganha é o libertado porque o libertador tinha tudo, mãos cheias; o outro, não.

Mas há libertados que se dizem reféns, e, mais tarde, percebemos que a situação verdadeira era inversa, e que, ao se desfazer o laço, quem tinha as mãos cheias era o libertado, mas essas eram preguiçosas.

Acredito que, quem mais ganha é aquele que ganha, com a liberdade, a verdade; ou, quem ganha, com a verdade, a liberdade.

A frase acima parece dizer a mesma coisa, mas não diz. Só não vou explicar porque, como eu disse, meu cérebro saiu do lugar e ele cansou de desenhar para os outros entenderem.


Por Suzana Guimarães