domingo, 30 de outubro de 2011

SOBRE A FALTA DE ADEUS




O que sei, é que não se entra na vida de alguém anunciando ' estou entrando, viu? '. A gente entra por acaso ou por vontade, por curiosidade, porque gostou, achou bonito, e muitas vezes sem ao menos saber que entrou. Mas, entrou. Abriu janelas, fechou, bagunçou gavetas ou não, mas entrou e se mostrou e foi visto, foi aceito, cortejado, amado. Se o invadido ou seduzido permitiu ou não, pouco importa.


Excetuando os casos de invasão imprópria, indevida ou abusiva, ninguém gosta de quem entra, fica um tempo longo ou curto, ou incontável, e depois some, desaparece.

Não se entra na vida de alguém com lista de por fazer pregada no peito ou no meio da testa. Acontece. Entra-se. Instala-se no sofá, compartilha música, vinho, segredos, risos e muitas vezes rios de águas, águas fáceis, que escorrem no rosto amparado por dois olhos atentos, presentes, quem sabe chorosos também.

Excetuando os casos ' foi melhor assim', aquelas saídas silenciosas, porém necessárias, ninguém gosta da falta de adeus, da falta de anúncio de morte comprovada.

Chegou a mim, uma comprovação de morte, mas não chorei. Simplesmente porque chorei quando o corpo desapareceu. Chorei demais! Na época, gritei, emudeci, tentei correr mesmo que para lugar nenhum, pensei enlouquecer, sofri, doeu, incomodou dia e noite, fiquei sem saber se era fome ou má sorte. Enfim, me descabelei, me rebelei e depois calei.

Quando se entra na vida de alguém, deixa-se pelo menos um nome, aquele que, mais tarde, você encontrará na sala de embarque de um aeroporto, numa voz aguda que chama por alguém que se atrasou; na sala de aula, no programa da televisão. Em letras garrafais num 'outdoor', miúdas em folha de jornal, num bilhete perdido numa sala de cinema... um mesmo nome, um outro alguém.

O que sei, é que quando se entra na vida de alguém, ocupa-se um espaço.

Ontem, eu não chorei, meus olhos apenas umedeceram. Senti um aperto no peito. Seco. Um estranho silêncio apoderou-se do ambiente à minha volta, digo, do espaço até onde vai o brilho de minha aura - silêncio de dor. Coisa só minha, incomunicável, indizível. Não se morre duas vezes.

Foi a comprovação da morte de alguém que sumiu sem dizer adeus, volto já, vou ali pra nunca mais, me esqueça. Um certo alguém que entrou na minha vida, ficou um certo tempo e se foi, sem deixar um sinal sequer de despedida. Depois, arrependido ou sentindo falta, quis voltar. Tarde demais.



Por Suzana Guimarães