terça-feira, 26 de junho de 2012

EU ANDO NO ESCURO


(Suzana Guimarães por LRMeneghini)

Minha avó era pequena. Ela se esticava toda para pegar as coisas nos lugares altos, dizia que era preciso alongar, forçar o corpo para não atrofiar de vez. Eu ando no escuro para viver um pouco um mundo à parte, que não domino. Vasto mundo, esse. No escuro, raramente acerto no primeiro movimento, mas nem por isso corro atrás da luz. No escuro, eu sinto mais, calculo o passo e o dou, não fico apenas na expectativa dele. No escuro, o mundo parece se encolher e ao mesmo tempo se perder de mim e eu dele. É um exercício que faço. Minha avó se esticava, o que não aumentou o seu tamanho, mas lhe deu um certo jeito, uma boa flexibilidade para se virar sozinha, aos 80. Eu ando no escuro, para saber até onde podem ir meus braços, e, percebo que eles podem ir longe e facilmente, mas é preciso cuidado e uma certa calma, além de determinação. Mais fácil seria acender a luz. Mais fácil pegar a fruta na fruteira. Mas, cadê a fruteira? É preciso fazer esforço, o que a maioria não quer. A maioria quer maçãs caindo em acasos, quer saber o número do bilhete premiado. Se eu sonhasse para você, você seguiria as diretrizes, você diria sim? Não adianta sacudir o vidro do remédio antes de tomá-lo se você não tem disciplina para ingeri-lo, não adianta você sacudir a sua vida, se você não sabe o que fazer com ela.

por Suzana Guimarães