domingo, 6 de maio de 2012

CARTA DE ENCONTRO, NÃO NOS CABE DESPEDIDAS


(Suzana Guimarães - arquivo pessoal)



Los Angeles, 6 de maio de 2012.
 



Querido,

Maio me chama, assim como você. Maio pede as minhas madrugadas, você pede que eu não vá. Não, esta não é uma carta de despedida, é de encontro.

Aquele avião ainda não alcançou os céus, os céus de maio são para serem voados com pés em terra. Eu ainda não invadi o aeroporto com minhas bagagens, não entrei no táxi amarelo, não fechei a porta de casa, nem arrumei as malas, indecisa por não saber organizá-las... eu ainda não lhe disse adeus, até breve, I`ll see you, bye, good bye... eu ainda estou aqui. A noite correu solta sem minhas rédeas e a madrugada chegou antes mesmo que eu tomasse pelo menos um chá, um bom e demorado banho quente, revesse o dia, amansasse meus desejos. E aqui estou, porque é maio. Porque penso em teus olhos doces, parados, despedindo-se. Como você se despede de mim! Quantas vezes? Quantos adeus? Há quanto tempo? Não pense, não pense, não tente desvendar nosso encontro, ele é sagrado, imune a nós mesmos.

Maio pede cartas, pede caminhadas, passos lado a lado, pede riso, muito riso e chão. E quantas voltas eu daria neste mundo para nunca mais me despedir? Você diz que parto em caminhada leve, eu sei, uma única viagem, dois destinos distintos; de um lado, quem vai, parece que sempre vai mais leve, do outro lado, quem fica e carrega o peso do vazio. Ah, como pesa o vazio, teus olhos dizem e também o silêncio do último dia, que grita, mudo! A ausência mais presente que o mais presente e barulhento dos convidados de uma grande festa. Um corpo que você vê passar, mas não passa. Um cheiro que você sente em golpes de vento, mas que do nada sai, umas vozes e um certo riso que se assemelham, mas que não são.

Eu pareço leve? Como, se levo você comigo? Digo que meu adeus é breve, você diz, longo. Como, se cheguei ao fim da longa jornada?  Acabo de chegar, deitar o peso no chão e pousar meus olhos nos teus, gruta onde eu poderia adormecer, pela segurança da certeza.

Essa não é uma carta de despedida, é carta de confissão, porque é maio, porque me perco em certas madrugadas, porque ando vendo teus olhos gravando na memória meus passos, meus atos, meus vãos, lugares onde guardo você, silenciosamente, lugares perdidos, cidades proibidas... um dia, quem sabe, abro a porta desses sítios onde você reina, senhor e dono absoluto da senha, da palavra principal. Diga, diga o que lhe pende dos olhos e eu lhe direi que sim.

Beijos,

Suzana Guimarães