quarta-feira, 1 de maio de 2013

CARTA AO SABOR DE LICOR E AMOR



Los Angeles, 30 de abril de 2013.



Duas doses de Cointreau, uma  banda estranha tocando músicas mais estranhas ainda, um pedaço de chocolate amargo, o silêncio enfim alcançado, uma vontade enorme de deitar-me no sofá e deixar-me ficar por dias, noites, ensolaradas tardes ou não, para vestir a minha nova pele, delicadamente, em respiração regular...Todos dormem, já é noite e eu estou escrevendo  esta carta somente  porque você esperou a noite toda pela primeira... lembra-se? Faz tempo.  
Você nunca me pediu uma carta, nem um poema, sequer um leve conto, eu sei, não precisa contestar minhas palavras, nem pensar, não quero que você pense, apenas sinta e deixe-se levar, relaxa, a vida é bem menos e bem mais fácil do que você imagina. Acredito que não precisamos mais nos apresentar, já podemos dispensar as palavras, explicações, e esse é o único meio que tenho de dizer-lhe isso. Eu prometi  uma carta para você, mas depois, me vi perdida, por isso, a demora... escrever o quê?
Cara, eu cansei. Cansei, cansei, até o núcleo mais oculto das minhas células, algo tão forte que só renovando, fazendo de novo, recomeçando, sem olhar muito para trás. Não duvide da minha determinação, nunca faça isso, sou aquele tipo de pessoa que só diz que irá fazer se for mesmo.
Segui  ‘mensagens’ colocadas  ‘especialmente’ para mim pelo caminho que era percorrido... Creio nesses sinais, sim, são sinais, enigmas, o grande problema foi a tradução mal feita deles. Errei em muitas das minhas interpretações... e, aí, chega você fazendo-me perguntas, questionando certezas...
Seríamos felizes em nossa cumplicidade – maior que nós, que nossas tolas vontades, determinadas decisões de ‘nunca mais” – se você parasse de perguntar e eu de tentar explicar o que eu não sei. E, atualmente, como dizia meu pai, “não sei, não quero saber e tenho raiva de quem sabe”.
A música se repete, já não posso mais com tanto licor e eu preciso dormir cedo porque acordo às 6h. Por que você não vem conhecer o meu mundo? Eu tentaria caminhar no teu, eu ouviria aquele chato cantor das emoções, tomaria chá, que detesto, e tiraria todos os saltos das gavetas para parecer um pouco maior. Você comeria cactus fritos e saborearíamos algumas margaritas, sim, você iria tentar aprender a se embebedar. Ou então, seguiríamos para a Baviera e degustaríamos todas as cervejas de lá, ou o famoso uísque da Escócia. Que tal um tango que eu não sei dançar,  na Argentina? Ou simplesmente alcançar o mais alto dos morros de um Belo Horizonte para ver uma  entediosa segunda-feira morrer...
Não tenho longas cartas para você porque não precisamos mais... tenho mãos para compartilhar, voz arrastada para lhe dizer e uma enorme felicidade por saber que você está por perto, mesmo morando  abaixo da Patagônia e eu, para lá dos Montes Urais.
Não precisamos mais de palavras, precisamos de nós, francamente cúmplices, degustando o prazer de um encontro, porque  a chance de nos conhecermos era remotíssima.  Posso renunciar ao dinheiro, ao sucesso, ao sexo, mas, à felicidade, nem os loucos renunciam.

Beijo,

Suzana
Por Suzana Guimarães