By Luís G. Meneghini |
terça-feira, 17 de dezembro de 2013
CARTAS DE DEZEMBRO - a terceira
"Uma cidade no alto do Brasil, numa noite quente, num meio de dezembro de 2013.
A lua estava mais linda que nunca, entendi Fernando Pessoa, hoje, e, de fato, se eu tivesse nascido apenas para vislumbrar a magnitude da lua nesta noite, digo, já valeria a pena ter vivido.
Vinha caminhando devagar, apenas para poder contemplá-la um pouco mais. Saí tarde do trabalho. Apesar de ter dormido apenas 3h na noite passada, sentia-me feliz, a energia da noite estava boa, coloquei os fones de ouvido, 'Legião Urbana', e ao som da maravilhosa voz de Renato Russo ouvia o que a lua segredava a mim...
Ela sussurrava “há relacionamentos que trazem vida, outros que a tiram ao invés” e Renato Russo cantava “mas tudo bem, tudo bem, acho que estou gostando de alguém, e é de ti”.
(...)
Não tinha como não escrever nessa noite, não tinha como não dividir...
Beijo grande!
Que os bons ventos te cerquem...
K."
Uma cidade no sul dos Estados Unidos, numa noite fria, num meio de dezembro de 2013.
E eu dirigi sozinha até a academia porque meu filho não foi, estava reclamando de dor na mão esquerda... sinto falta dele, acostumei-me com sua presença, embora, já tenha ido só inúmeras vezes. Mas, agora, ele já é um adolescente, todo curioso e muito interessante e interessado e eu aprecio muito a sua companhia. Ele gosta de jazz, acredita?
Olhei para a Lua e ela estava opaca, bonita, mas opaca, toda enevoada, pois, aqui é inverno. E eu pensei em algum casal que não se encontra, que ainda não se encontrou. Uma dupla perdida, onde, enquanto um anda para o norte, o outro vai para o sul. Pensei que entre os caminhos há muito mais chão que aparenta haver. Há túneis quase nunca ultrapassáveis, há pinguelas prestes a não esperar mais por ninguém. Há vãos entre as rotas, entre as trilhas, há mais espaço que possamos imaginar. O mundo é enorme e o espaço e tempo para nos encontrarmos é pequeno.
É preciso uma força enorme para nos unirmos e outra, mais enorme ainda, para estarmos um diante do outro, em plenitude, inteiros. Não nos falta coragem, isso nós temos. Não nos falta desejo, isso já esparrama pelo chão, já pulou para fora do corpo, transbordou. Falta-nos a certeza de que realmente é real, palpável, a certeza de que não é mais delírio porque vivemos em oculta febre, a exagerar, a sonhar por além da conta. Após a visão de vários oásis, quando o verdadeiro se apresenta, é preciso alguém para nos beliscar, é preciso um empurrão, um grito de Deus, mesmo que seja um raio cortando o céu... mas, o momento do encontro e decisão é um instante ímpar, sem par mesmo, sou eu e o meu destino, cara a cara, e ninguém mais, mesmo que entre mil rostos. É a oferta: você escolhe ou não.
Meu pai sempre dizia, "O cavalo está aqui, cadê o reino?". O cavalo um dia chega e o perigo é pensarmos que não. Uma das coisas mais fáceis de se fazer na vida é desejar, pedir, pedir... Uma das coisas mais difíceis na vida é fazer a troca: aqui está o meu reino, me dá o cavalo; montar nele e ganhar o mundo.
"Há relacionamentos que trazem vida, outros que a tiram...", e o que mais vi foi a retirada e a gente aceita e se acostuma, parece que temos, na verdade, mania de sofrer. Pagamos altos valores por qualquer ninharia, um pequeno agrado, uma pequena decisão, uns galanteios que não trazem frutos. Uns beijos chochos, umas olhadelas preguiçosas, a gente até pergunta, "está interessado em ouvir?". Alguns sinais de interesse mais céleres que a desgraça, pois, essa, sim, instala-se, puxa a coberta, ajeita o travesseiro e fica. Geralmente, ocupa o mais reservado dos cômodos, o mais escondido e distante do resto, porque chega para ficar.
Mas, é noite, é dezembro, é o mês dos ventos na alma. É o tempo da calmaria, do descanso...
E eu ouço Groove Armada, Think Twice... feito um mantra.
Suzana
Por Suzana Guimarães.
Nota: a primeira carta foi enviada a mim, editada por mim e publicada com enorme carinho.