arquivo pessoal - SCG |
Nota: mesma publicação, na mesma data, em Contos de Lily.
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fotografia, por SCG |
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fotografia ÁGUA-VIVA, por SCG |
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SCG, por SCG |
fotografia, por SCG Depois que li as cartas, eram duas, decidi, "amanhã, amanhã, farei silêncio". Igual fazia nos tempos da escola de freiras, numa cidade do interior de Minas Gerais. Um dia todo falando o mínimo possível, e, se possível, falando nada. Eu, sempre tão lotada de palavras e risos, eu bem que gostava daquilo. As colegas, algumas freiras e eu íamos todas para a mata do colégio, para meditar, naquela idade, para mim, fazer nada. E eu gostava muito daquilo, apesar de todos os meus excessos. Depois do já prometido para mim mesma, tomei meu banho, espécie de descarrego, às vezes bom, às vezes ruim, hoje, foi silencioso, simplesmente silencioso. Depois do já prometido, abri o "laptop" para desligá-lo. Por vício, rolei as atualizações dos amigos. Encontrei uma postagem do meu amigo Lu Cidreira (clica aqui), prestando homenagem à Iemanjá. Lembrei-me do meu texto (clica aqui), lembrei-me das duas cartas, cada uma com seu peso de silêncio. E eu tão sempre lotada de palavras, estou sem nenhuma. Iemanjá passou feito vento ligeiro, espirrou perfumes em mim, espiou as cartas, seguiu adiante, deixou-me com a certeza de que amanhã (quase hoje aqui, já amanhã no Brasil) é dia de retiro, dia de silêncio no colégio das freiras. Suzana C. Guimarães |
"Penso que você está para o verão em seus últimos dias quando o sol já se distancia e exibe no final do dia aquele vento que vem anunciando o outono e a paisagem se intensifica numa beleza natural exibindo aos olhos um entardecer intrigante que nos pede uma cadeira no meio do nada, um pouco de silêncio e contemplação. Pede ainda um cálice de vinho e o aconchego natural das palavras inventadas. Um olhar para dentro e uma compreensão íntima sem perguntas ou respostas."
Diurno Inacabado
Para a Suzana Guimarães, com estima e admiração
«Cabem-me nos passos da casa toda
o idioma tardio
o ido sopro do silêncio, a chuva
na mínima fogueira acesa por dentro
e por pegadas, no metal e pedra
a marca por lapidar no fogo branco,
a luz macia e baça que não se quer acrescentar ao dia.
Do lugar sonâmbulo que me traz por casa,
ainda a casa toda, trago
por vestígio de espelho o que hoje não me acordou,
e por dor passageira onde sou invenção do ventre
o cada instante que me sobra escuro,
e já não sou.
Cabe-me no peito o pássaro,
o mínimo vento da asa, aragem
o alicerce da casa onde os meus passos não me adivinham,
passada rápida, contrafeita
pelo tempo que foi, onde não estou
nem fui, nem me rejeita:
- Inventarei o traço convulso
no que por minhas pegadas me imagino que sou,
onde me cabem as sombras do todo o passo
cicatriz do dia inteiro por meu mínimo horizonte,
o pouco de meu corpo compasso
a medida itinerária, a desajeitada ciência
do que mais adiante será o resto do corpo,
do que não me cabe, nem trago ou sou:
- Esse arrumo, apenas um passo
do que antes foi meridiano da casa,
do traço do tempo que não me alterou.
É vestígio do passo, minha casa toda,
o meu lapso tempo
que trago por astro, peito adentro
é o lugar onde me invento, diurno
por defeito.»
Leonardo B.