quarta-feira, 6 de agosto de 2014

Um pouco sobre loucura


(Suzana Guimarães, by Hilário)


Antes mesmo de abrir os olhos, pelas manhãs, sinto presentes meus fantasmas, meus delírios, meu mundo cão do qual não me desfaço. De lá para cá - não se importe com datas - disseram-me que se apaixonaram por mim porque sou bonita e escrevo bem. E, por isso, como consequência, devo retribuir a paixão, ou amizade, como queiram. De lá para cá, ouvi e li de tudo. Uma amiga escreveu um texto sobre hospício, loucura própria e alheia. Ela, a Tânia*, disse que não se pode abraçar e carregar para si a doideira do outro. Diz que o perigo está aí, quando você vive a loucura alheia, e não a sua.

Pois bem, às vezes, eu me atrevo, e, diante de um chamado, coloco um dos meus pés dentro do seu círculo, só para ver como é, só porque gosto de sobrevoar áreas belas e também as fedidas. Contudo, retiro-o, retiro esse pé, e faço isso normalmente com bastante barulho, quase aos berros.

Então, por que pensaria alguém que eu viveria loucuras alheias? Porque coloquei um pé lá? Fui apenas espiar. Não fiquei para o contágio. 

Ser bonita e escrever bem não lhe dá nenhuma prerrogativa sobre mim, assim, de você para mim. Qualquer consequência será de mim para mim mesma. Entendeu? Ou eu deveria levantar numeração de álgebra?

Às vezes, nem coloco meu pé, nem olho, nem presto atenção porque estou ocupada, vivendo minhas loucuras, mas há de aparecer alguém...

De lá para cá, disseram-me que eu levava ao delírio, à confusão mental... pessoas que chegaram e me convidaram para fazer um passeio com elas. Claro, ninguém mencionou a palavra loucura. Eu fui, não atrás de maluquice alheia, mas por diversão, por encantamento ou por nada, porque sair por aí para fazer nada é algo extremamente normal. O mundo está tentando dizer que não, mas discordo veementemente. Chamaram-me, e, quando pulei fora, gritaram para mim, "Sua louca! Foi você quem me induziu!". 

Há pessoas que sabem de seu poder de influência sobre as outras, e, assim sendo, aglomeram multidões, todas querendo viver a loucura delas, de quem as convidou. Por isso, o mundo não conserta, porque há muita gente desprezando sua própria demência para viver a de qualquer um outro; de preferência, que tenha alguma magia, alguma coisa de endoidar mais ainda.

Faço minhas as palavras da Tânia, viva o seu próprio delírio porque não há mesmo escapatória e a vida pode até se tornar muito chata. 

Não inventa de mergulhar em mundos que você desconhece mais ainda, muito além do seu próprio. Não leia livros de autoajuda se você nem sabe ler. Leia a si mesmo, tenho certeza, o resultado será pouco satisfatório, então, deixo uma dica para você, procura ajuda de terceiro competente. Sozinho, no poço, tudo fica mais escuro.


Suzana Guimarães


Nota: *Tania Contreiras - Arte terapeuta